No dia 16 de Abril de 2025, o Instituto enviou um protesto à Comissão Europeia relativo à ilegalidade do seu esquema de rearmamento:
Queixa relativa a má administração, apropriação indevida de funções, quebra grave do princípio da cooperação institucional e violação do princípio da subsidariedade pela Comissão Europeia e sua Presidente, Ursula von der Leyen, no contexto da apresentação do Plano ‘REARM Europe’.
Exm.ª Senhora,
Escrevo enquanto Director do Instituto Trezeno, cujos associados expressaram alarme com a apresentação do plano ‘ReArm Europe/Prontidão 2030’, no passado dia 4 de Março – aprovado no dia 6 de Março – pela Presidente da Comissão, e o qual tem em vista um programa de comunitário de rearmamento massivo, alcançando valores na ordem dos 800 mil milhões de euros.
Consideramos que esta iniciativa extravasa os poderes da Comissão Europeia e da sua Presidente, nos termos dos tratados europeus.
Desde logo, qualquer tipo de iniciativa no domínio do armamento e da Defesa, cai na jurisdição do segundo pilar da arquitectura comunitária, i.e a Política Externa e de Segurança Comum (PESC). Mesmo após a aprovação do Tratado de Lisboa (Tratado da União Europeia), a competência pela aquisição e gestão de armamentos, tem um cariz exclusivamente intergovernamental.
Nos termos do Artigo 4º TUE, “as competências que não sejam atribuídas à União nos Tratados pertencem aos Estados-Membros“, “a segurança nacional continua a ser da exclusiva responsabilidade de cada Estado-Membro” e “em virtude do princípio da cooperação leal, a União e os Estados-Membros respeitam-se e assistem-se mutuamente no cumprimento das missões decorrentes dos Tratados“.
O Artigo 15º estipula ainda que o “Conselho Europeu dá à União os impulsos necessários ao seu desenvolvimento e define as orientações e prioridades políticas gerais da União” e que o “Presidente do Conselho Europeu assegura, ao seu nível e nessa qualidade, a representação externa da União nas matérias do âmbito da política externa e de segurança comum, sem prejuízo das atribuições do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança“.
Para total clarificação, o artigo 17º acrescenta que a “Comissão executa o orçamento e gere os programas. Exerce funções de coordenação, de execução e de gestão em conformidade com as condições estabelecidas nos Tratados. Com excepção da política externa e de segurança comum e dos restantes casos previstos nos Tratados (…)”.
No artigo 24º, reitera-se que a “política externa e de segurança comum (…) É definida e executada pelo Conselho Europeu e pelo Conselho, que deliberam por unanimidade (…)” e que “esta política é executada pelo Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e pelos Estados-Membros (…)”.
Finalmente, no artigo 41º lê-se que “as despesas operacionais decorrentes (…) ficarão igualmente a cargo do orçamento da União, com excepção das despesas decorrentes de operações que tenham implicações no domínio militar ou da defesa e nos casos em que o Conselho, deliberando por unanimidade, decida em contrário“.
Igualmente ignorada foi a Agência Europeia de Defesa. No artigo 42º, a “agência no domínio do desenvolvimento das capacidades de defesa, da investigação, da aquisição e dos armamentos (a seguir denominada “Agência Europeia de Defesa”) identifica as necessidades operacionais, promove as medidas necessárias para as satisfazer, contribui para identificar e, se necessário, executar todas as medidas úteis para reforçar a base industrial e tecnológica do setor da defesa, participa na definição de uma política europeia de capacidades e de armamento (…). Ora, a Presidente Von der Leyen anunciou que “(…) the Commission will invite the EDA and the EU Military Staff to share their expertise, as appropriate“, o que significa que a AED não foi tida nem achada na preparação de um plano de rearmamento que, como acima estabelecido, a Comissão nem sequer tem autoridade para encetar, ou propor. https://eurocid.mne.gov.pt/sites/default/files/repository/paragraph/documents/29923/white-paper.pdf
As implicações são ainda mais graves pois a Comissão propõe agudizar o endividamento dos estados-membros: “the Commission proposes a new EU regulation under Article 122 of the TFEU to provide Member States with loans backed by the EU budget. With up to EUR 150bn, the Security and Action for Europe (SAFE) instrument will strongly support a significant increase in Member States’ investments in Europe’s defence capabilities (…)”.
Relembramos que a dívida pública da União se encontra a 81.5% do PIB e que a dívida pública do estado proclamadamente visado pela corrida ao armamento, a Rússia, é inferior a 15%. Um agravamento drástico da despesa pública arrisca inflação assim como uma menor disponbilidade dos mercados de capitais para financiamento do sector comercial e dos cidadãos.
Sobretudo, tais medidas contradizem os princípios fundamentais da constituição da UE, a qual, segundo o artigo 3º (TUE) “(…) tem por objetivo promover a paz (…)” e o “crescimento económico equilibrado e (…) estabilidade dos preços“.
Uma vez mais a Comissão arroga-se competências que não possui. O Artigo 122º (TFUE) detalha ” (…) medidas adequadas à situação económica, nomeadamente em caso de dificuldades graves no aprovisionamento de certos produtos, designadamente no domínio da energia” que nada se relacionam com despesa em armamento. O mesmo artigo explicita a condicionalidade de que “(…) um Estado-Membro se encontre em dificuldades ou sob grave ameaça de dificuldades devidas a calamidades naturais ou ocorrências excepcionais que não possa controlar (…)” o que o Livro Branco mencionado, em nada concretiza.
O artigo 122 apresenta a possibilidade de se “(…) conceder ajuda financeira da União ao Estado-Membro em questão (…)” mas o implícito inferível traduz-se em verbas do orçamento comunitário já existente, e em nada do artigo se poderia deduzir a liberdade de impressão de moeda ou contracção de dívida, para auxiliar estados-membros.
Por conseguinte, o Instituto Trezeno solicita a abertura célere de um inquérito sobre as implicações das acções da Comissão sobre o disposto, o apuramento público de responsabilidades e a reposição da legalidade e da divisao de competências entre as instituições.