Por Lourenço Ribeiro

N’O Observador

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Eleições na Roménia: entrevista a George Simion

Com 41% de votos na 1.ª volta, George Simion disputará a 2.ª volta com Nicușor Dan, presidente da câmara de Bucareste, promovido pela imprensa como o candidato “centrista”, “pró-europeu” e “pró-Nato”.

O candidato presidencial romeno e líder do partido Aliança para a União dos Romenos (AUR), George Simion, concedeu uma entrevista  na véspera das eleições presidenciais do seu país, através dos bons ofícios do think-tank Instituto Trezeno. À data em que escrevo, já é sabido que Simion, tendo vencido a primeira volta das eleições presidenciais com 41% dos votos, irá disputar a segunda volta com Nicușor Dan, presidente da câmara de Bucareste e amplamente promovido pela imprensa como o candidato “centrista”, “pró-europeu” e “pró-NATO”.
 
Para além da Roménia: o movimento conservador e soberanista
 
Quanto à incorporação da AUR nos grupos parlamentares europeus existentes, Simion considera o European Conservatives and Reformists (ECR) um conjunto de “parceiros fortes que defendem a soberania, a tradição e a verdadeira democracia”. Isso, no entanto, não o impede de considerar construtivos eventuais entendimentos e diálogos com outros grupos parlamentares da chamada “direita radical”, nomeadamente o Patriots for Europe (PfE) e o Europe of Sovereign Nations (ESN). A sua visita aos Estados Unidos da América (EUA) — onde aproveitou para conhecer as instalações de think-tanks e participar em algumas das suas reuniões, como o Instituto Hudson (Hudson Institute) e o Conselho Atlântico (Atlantic Council), além de encontros com altos funcionários do Departamento de Estado — reforçou a sua convicção de que a relação transatlântica deve ser fortalecida. Disse-nos também que se identifica com os valores defendidos pelo movimento Make America Great Again (MAGA): “soberania, família, fronteiras fortes e respeito pela vontade popular.”
 
Aproveitou ainda para nos informar, a propósito da oposição à afiliação do partido Fidesz — liderado pelo primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán — ao ECR, devido a divergências em relação às políticas de proteção das diásporas romena e húngara, que a relação da AUR com esse partido se baseia “no respeito mútuo e no interesse nacional”.
 
Política energética romena
 
Ao ser questionado sobre a posição estratégica da Roménia e a sua visão quanto ao papel do país na política e infraestrutura energética europeias, o candidato presidencial insistiu na necessidade da Roménia, enquanto país da Europa de Leste, se tornar num dos pilares energéticos do continente. Para que a Roménia se afirme como um eixo energético — um objetivo que, aos olhos de Simion, deve ser concretizado — os líderes do país devem negociar “firmemente, defender os nossos [romenos] ativos e investir na refinação e na infraestrutura”. Segundo o candidato da AUR, os recursos do Mar Negro, nomeadamente o gás natural e o petróleo localizados em território romeno, “devem ser explorados, primariamente, no interesse da Roménia, em vez de serem entregues, a baixo custo, a corporações oportunistas”.
 
Por isso, compromete-se, enquanto potencial futuro presidente da Roménia, a “transformar a nossa (romena) riqueza natural em prosperidade para o nosso [romeno] povo, e não apenas para uns poucos privilegiados”.
 
Política externa e de defesa romenas
 
Quanto ao investimento em defesa e à crescente procura mundial por armamento, Simion não duvida da necessidade de a Roménia cumprir as suas obrigações para com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e em modernizar o seu exército. Atento e preocupado com o perigo da corrupção — que considera ser o principal responsável pelos gastos excessivos e pouco eficazes em termos de segurança nacional — o candidato acredita que o respeito por compromissos internacionais não deve ocorrer à custa da transparência, dos interesses romenos nem do investimento em educação, saúde e infraestruturas. O líder da AUR sublinha que a Roménia deve continuar a ser “um aliado comprometido”, mas também deve “ter voz e proteger o bem-estar” do povo romeno, evitando uma obediência cega ou ações que ignorem os interesses nacionais, que são frequentemente fontes de “instabilidade”.
 
Focando-se na guerra russo-ucraniana, Simion afirma que a sua posição — e a do seu partido — é de defesa da paz, que deve ser promovida através da proteção das comunidades romenas e da prevenção do agravamento do conflito, que devem ser, segundo o próprio, prioridades centrais da política externa do país. Seguindo essa linha de pensamento, exclui a possibilidade do envio de tropas romenas para solo ucraniano ou russo. Quando questionado sobre a imigração, relacionando-a com os recentes acontecimentos no Médio Oriente, sugere que a União Europeia (UE) deveria centrar-se mais na “estabilidade, na reconstrução e no respeito pela soberania nacional, em vez de repetir erros intervencionistas do passado”.
 
Imigração A imigração legal e controlada, sempre em conformidade com a proteção da identidade nacional, é o modelo que um governo da AUR pretende defender.
 
A situação interna e a candidatura de Călin Georgescu
 
Questionado sobre se a desqualificação de Călin Georgescu da corrida presidencial, em Dezembro de 2024, constitui uma perseguição política e quais as consequências dessa interferência nas eleições romenas, Simion descreveu-a como um “ataque aberto à democracia”. Aproveitou para enquadrar esse episódio num padrão mais amplo, que inclui Marine Le Pen, em França, e Donald Trump, nos EUA: “truques judiciais (…) usados para eliminar candidatos da soberania popular.”
 
Para o candidato da AUR, o que aconteceu há cinco meses deve ser visto, pelos romenos, como uma manifestação da “supressão burocrática” e como um afastamento relativamente aos valores europeus — valores esses que, em teoria, incluem a realização de “eleições livres”. Simion considera que o pronunciamento do Tribunal Constitucional da Roménia reflete o ambiente atual do país: liberdade de expressão restringida, meios de comunicação controlados e censura política. Recordando o caso de Georgescu, admite estar preparado para a possibilidade de a sua própria candidatura ser bloqueada, o que, segundo ele, seria uma evidência da “fraqueza” do regime e do “medo” em relação à escolha e à voz populares.
 
Conclusão
 
A entrevista concedida por George Simion revela-se esclarecedora em vários aspectos. Em primeiro lugar, fragiliza a ideia de que se trata de um político isolacionista e desconfiado de alianças, tratados e convenções com os quais a Roménia se compromete, especialmente no que diz respeito à relação com os EUA. Contudo, isso não deve fazer esquecer que o candidato não considera recomendável a presença de tropas oriundas da Europa Central e Oriental na Ucrânia, o que pode levar alguns a suspeitar que não vê a Rússia como uma ameaça existencial à Roménia. Em segundo lugar, confirma a sua solidariedade para com Călin Georgescu, tendo dado a entender que o impedimento da sua candidatura se trata uma distorção da democracia e de uma rutura com os valores que a União Europeia sempre prometeu defender. Por fim, as suas propostas para a exploração energética, a formulação de políticas energéticas, a regulação dos fluxos migratórios e o rumo da política externa da UE são coerentes com as posições de muitos partidos soberanistas europeus.

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